Sempre tive a impressão de que o livro O Ócio Criativo é mais citado do que efetivamente lido, provavelmente por conta do excelente título. Li a obra de Domenico de Masi bem depois do frenesi inicial e minha impressão foi confirmada.

Apesar do início difícil e “histórico” demais para o meu gosto, a tese defendida em O Ócio Criativo é genial e merece ser lida por todos que acham que há algo errado em sofrer cinco dias por semana para relaxar dois, sempre presos na roda.

Devíamos ter mais sociólogos “nerds” como esse italiano para ver se a sociedade em geral entende o real significado da tecnologia em nossas vidas. Quer um exemplo?

Aquele que é mestre na arte de viver faz pouca distinção entre o seu trabalho e o tempo livre (…) Distingue uma coisa da outra com dificuldade. Almeja, simplesmente, a excelência em qualquer coisa que faça, deixando aos demais a tarefa de decidir se está trabalhando ou se divertindo.

Eu não saberia me definir de melhor forma. A tese de O Ócio Criativo é a de que na sociedade chamada de pós-industrial (por falta de um nome melhor) o homem não precisaria mais estar se matando de trabalhar oito a dez horas por dia enfurnado em um escritório.

O avanço da tecnologia permite que a humanidade se liberte de tanto trabalho e aproveite melhor o tempo livre, no que o autor chama de economia do ócio. Radical, O Ócio Criativo sugere uma redução drástica na jornada de trabalho, o fim do excesso de procedimentos nas companhias e defende com ardor o trabalho a distância.

As empresas seriam mais criativas, mais produtivas e reduziriam as despesas. Os trabalhadores teriam mais tempo para a vida pessoal, revitalizariam seus relacionamentos com a família, com o bairro, com a cultura, alimentariam a própria criatividade.

A defesa do teletrabalho vem pelas observações do autor de que, mesmo com toda a tecnologia disponível, continuamos trabalhando como operários de uma fábrica de linha de montagem do século XVIII. Temos horário para acordar, chegar ao trabalho, horário para comer, horário para voltar ao trabalho, para sair, para dormir. Temos funções a cumprir, livros de ponto para assinar, procedimentos burocráticos a satisfazer…

A empresa é um sistema que, com freqüência, produz infelicidade e medo. E desperta raiva ver que hoje em dia a infelicidade e o medo poderiam ser eliminados e, em vez disso, continuam a existir sem motivos: não são úteis a produtividade, são nocivos. (…) Assim, quando quero fazer com que uma regra da sociedade industrial sobreviva numa sociedade como a nossa, devo impô-la. Ou com a alienação, ou com a força física, ou ainda com a chantagem psicológica. E para fazer isso é preciso ter um desprezo quase total pela vida pessoal, afetiva e familiar dos empregados.

O autor de O Ócio Criativo adota o estilo de vida que prega. Montou o escritório de sua própria empresa no andar de baixo da casa onde mora. Trabalha com colaboradores a distância e afirma que, quando dá na telha, a equipe sai para passear pelas ruas de Roma. Não há muita distinção entre o trabalho e o lazer.

Minhas experiência com o livro O Ócio Criativo

Ócio Criativo de Domenico de Masi

Exercitamos atividades cada vez mais intelectuais, que implicam cansaço mental. E, para o cansaço mental, a compensação é justamente o ócio. (…) O Ócio Criativo é aquela trabalheira mental que acontece até quando estamos fisicamente parados. Ociar não significa não pensar. Significa não pensar regrar obrigatórias, não ser assediado pelo cronômetro, não obedecer aos percursos da racionalidade e todas aquelas coisas que Ford e Taylor tinham inventado para bitolar o trabalho executivo e torná-lo eficiente.

Entre 2007 e 2011, experimentei bastante com as teorias de Domenico de Masi e outras similares. Larguei o emprego, fundei um pequeno negócio, passei a trabalhar de casa e sem local definido. Lembro da empolgação da primeira vez que trabalhei na praia e de participar de uma reunião de negócios via Skype enquanto pegava a estrada.

Não me arrependo de nada. Isso proporcionou-me inclusive passar um ano morando na Espanha, uma das minhas melhores experiências.

Posso afirmar, entretanto, que a teoria é bem mais bonita que a prática. O teletrabalho, mesmo para quem é relativamente disciplinado, traz tantas armadilhas quando o esquema 8h ãs 18h no escritório. São apenas armadilhas diferentes.

Não há como ser diferente. Em praticamente todas as áreas, a solução de um problema sempre acaba trazendo outro problema, por vezes até mais complexo do que o anterior.

Hoje o executivo ainda vive trancado dentro da empresa e acaba tendo menos idéias e cada vez mais medo do mundo externo. Quando, no passado, produzia os parafusos que tinha que produzir, a empresa não tinha do que se queixar: menos intensamente vivia, mais obedecia à máquina e mais se mecanizava e produzia. Hoje não é mais assim: mais tempo alguém passa dentro do escritório e menos produtivo é, tem menos idéias.

Um exemplo da dificuldade na área em que atuei, a de desenvolvimento web. Muitas vezes o trabalho mistura-se com nosso tempo livre e com nossas pesquisas, fazendo desaparecerem as fronteiras entre estudo, trabalho e lazer. Bom por um lado, ruim por outro.

Muitas empresas, depois de terem selecionados pessoas medíocres, pelo fato de serem dóceis e manobráveis, e depois de terem sufocado todo e qualquer vislumbre de iniciativa com um amontoado de procedimentos e controles, sentem agora a necessidade de revitalizar a criatividade e subemtem essas mesmas criaturas a pseudoformadores, especialistas no assunto.

Finalizando esta já longa resenha, se você cita muito O Ócio Criativo mas ainda não leu o livro, não perca mais tempo.

Explore também as obras posteriores, como A Economia do Ócio e O Futuro do Trabalho. Pode trazer muito mais produtividade para sua vida do que manuais como os do Stephen Covey.

E lembre-se: ociar não é ficar de pernas para o ar. É atividade, criatividade, inovação. É qualidade de vida.

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Walmar Andrade

Walmar Andrade é um advogado, programador e jornalista que estuda a relação entre Direito Digital, Tecnologia e Comunicação. Pós-graduando em Direito Digital (UERJ), tem pós-graduação em Direito Legislativo (IMP-DF), MBA em Planejamento, Gestão e Marketing Digital (FECAP-SP) e Master en Comunicación Empresarial (INSA-Barcelona). Escreve também no site walmarandrade.com.br

6 Comments

  1. Excelente texto !!!

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  2. Muito bom os comentários, o taylorismo era uma verdadeira agressão ao trabalhador. Essa teoria de Domênico Damasi é humana e muito mais produtiva. A liberdade sempre foi e será um BEM para a humanidade. Assim, trabalhar com liberdade, (sem opressão) acho eu, possibilitará maior produção com mais qualidade. Além do principal que é a boa qualidade de vida propiciada pela teoria do ócio criativo.
    Parece-me que a microsoft já adotou este sistema de trabalho.

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  3. Admiravel a teoria e criatividade de se trabalhar sem se prender a 8 hrs dentro de um escritório.

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  4. Estou lendo,e gostei muito da resenha, muito semelhante com a ideia que eu absorvi do que já li do livro. Gracias!!!

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  5. O mais grave de hoje é isso: gente demais para ensinar!!!

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